Editorial
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Aviso
Prévio da Silva,
desempregado em História pela USP
Atualmente
extinguem-se os empregos. As máquinas "livram"
o homem de suas tarefas. Deveriam mas, ao contrário,
roubam seu sustento. Culpa delas? Não!
As máquinas não podem ser culpadas. A culpa
é do mercado! Apenas do mercado? Ele anda, corre,
vê, quer, deseja? Não? Então, como pode
ter culpa? Há uma prosopopeização do
mundo: ora as máquinas, ora o mercado assumem características
humanas. Nem as máquinas, nem o mercado podem sentir,
ver, ouvir, falar, reagir, oprimir... São características
humanas, não artificiais.
Os homens e seus sistemas manipulam máquinas e mercado.
Daí decorrem miséria, fome, guerras, desempregos...
Empregos? Estão em extinção. Fazem
promessas políticos, empresários, filantropos
de plantão. Não há mais como criá-los
para todos; as máquinas substituirão homens
e mulheres nos empregos. Como querem aqueles que manipulam
o mercado.
Que queremos nós, empregos? Vimos que são
raridades. Daqui em diante, emprego é para máquinas...
E para os humanos?
Queremos
ócio produtivo, não empregos. Que temos a
construir? Nada! Transformamos a natureza, mudamos o mundo;
desviamos rios, represamos mares, ligamos continentes. O
que falta? Desfrutar de tudo isso. Alguns desfrutam, mas
todos podemos e devemos desfrutá-los.
Na França alguns desempregados reivindicam a divisão
da riqueza, não o emprego. Estão certos? Seguro!
Perceberam que não há nada a fazer, somente
dividir. Querem desfrutar do tempo ocioso, como diz o sociólogo
italiano Domenico De Masi. Os movimentos de trabalhadores
dirão que são loucos, alienados tudo o mais...
Resta-nos o movimento do ócio, do desfrute, da rede.
Deitemo-nos.
Não queremos apenas crescer X % ao ano, ampliar os
negócios, mais empregos, maiores salários
e promessas que não se cumprem! Essa revolução
será na rede. Deitados, mas não eternamente
em berço esplêndido.
Queremos o ócio produtivo, o Tietê despoluído;
crianças e os outros bem nutridos. Queremos o movimento
da rede, para laaá e para caaá, a água
de coco, o mate, a amazônia com índios, o sol
e a lua, a MPB na rádio, a cerveja na história,
a erva para viajar, filmes bons, ler...
Não queremos muito. São sonhos possíveis.
Os sonhos são humanos. As máquinas não
desejam e o mercado não age por si. Os homens sonham,
e seus sonhos realizam-se. Queremos produzir mais e mais?
Não! A natureza é finita. Para que o mercado?
Para que sermos clientes? Não. Esses homens estão
loucos!
Como os desempregados franceses, exijamos a divisão
da riqueza. Espalhemos a rede para o mundo, como fazemos
com o futebol.
Preguiçosos de todo mundo, deitai-vos no movimento
ocioso da rede.
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A
comédia de erros
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Glauceste
Urano da Silva,
O governador Covas não deve ter visto os meninos
da FEBEM Tatuapé ou mentiu ao falar para os pais
dos adolescentes internados, que, no dia 27 de julho, após
o levante de três dias, todos estavam bem lá
dentro, à exceção do garoto que foi
ferido na perna. O governador ainda empenhou sua palavra.
Mas eu não a aceito porque também estive no
Complexo Tatuapé no mesmo dia, vi e conversei com
dezenas de internos das "unidades educacionais"
10 e 12, que traziam em seus corpos diversos ferimentos,
inclusive na cabeça, causados pelo batalhão
de choque da PM, na noite do dia 26 de julho e em 27 de
julho pela manhã, segundo as próprias vítimas.
Covas errou, como ele mesmo assumiu, ao ter se omitido sobre
como se tratam os adolescentes em conflito com a lei. E
continua errando ao tapar os olhos ou mentir às pessoas
que sofrem nos portões das instituição
total, incomunicáveis com seus filhos.
Em seguida, todos os jovens adultos que ainda cumprem medida
sócio-educativa por atos infracionais praticados
quando eram menores de 18 anos, foram transferidos para
o estabelecimento penitenciário do Carandiru. Nenhum
deles cometeu um crime e foram postos ao lado de criminosos.
Não há sequer um plano educativo para que
esses jovens se reintegrem à sociedade.
O adolescente privado de liberdade não está
privado de todos os seus direitos, ele deve ter acesso à
educação, a cursos profissionalizantes, a
atendimento médico e psicológico, à
sua família etc. Assim, terá condições
de reabilitação e poderá voltar ao
convívio social na real condição de
cidadão, no gozo de todos os seus direitos e com
consciência de seus direitos.
Ao menos uma vitória foi obtida na justiça
para desfazer o que o governo fez. Os jovens deverão
voltar à FEBEM que, se não é o local
mais apropriado às regras estabelecidas no Estatuto
da Criança e do Adolescente, é o que temos.
Covas, mais uma vez, ao invés de reconhecer a sucessão
de erros e agir imediatamente, transfere-os lenta e gradualmente.
Covas errou e continua errando. Seria cômico, se não
fosse trágico.
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Jazz
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Allan
Traços dessa geometria-gelatina
Fluindo no rádio à cabeceira
A blues-woman canta amigos
Beijos
Mãe
Atos paliativos quaisquer
Jazz
incessante no decorrer aberto dos dias
Harmonias. Contrapontos.
Convicto
Que todas as incertezas são coerentes
Como o caos
Coerentes
Com o sorriso do Sol
Das chilenas
Com vermelho
Com as geladeiras feitas para guardar poemas
Os
paliativos com que nos ocupamos,
As respostas das agulhas
Na música da cabeçeira
Sorridente e triste,
Guardamos e desfrutamos em nossas orações
Reverenciando o Deus-Absurdo
Tempo
e espaço cortados
Sangrar e sorrir
Face guardada à parede de um beco
Visão descobrindo um espelho
Perspectiva ensandecida
Contrabaixo noturno
Dizendo não às mentes sãs
Sua linha fulgurante
Quebrando os grilhões estáticos dos olhos
Buscando uma senha provisória
Buscando vida além
das luzes azuis
além das salas
além dos diabos que nos carreguem
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Coluna
do Edi
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Edi
Leal Fadiga da Silva
Estamos
vivendo uma farsa. Enquanto estamos aqui soletrando as ultimas
noticias da nova era nos excluindo de ser motor ou possuir
qualquer voz ativa, está acontecendo um processo
quase irreversível de um massacre econômico
e exclusão social, miséria, fome, falta das
condições mínimas de direitos humanos
e de um uso excessivo das forças armadas em condições
tão democráticas como as que podemos encontrar
aqui em América Latina. E disto que chamamos desenvolvimento
hoje, não creio que possa trazer gargalhadas um dia.
E ainda vem um desses presidentes brasileiros me dizendo
que a culpa é do FMI. A culpa é da revolução
socialista que se conspira no Brasil! Bem que o governo
poderia já ter liberado aquelas terrinhas logo, pois
assim o preju seria menor aliviando o orçamento
do exército em possíveis rebeliões
futuras.
E que me dizem desses detentos das Febéms e
similares, que desde dentro da guerra de asfalto produzem
as maiores estatísticas das grandes cidades em todo
o terceiro mundo sem que nenhuma justiça se ocupe
realmente deles.
O bom da globalização é que vamos poder
viver no mesmo globo os vários tipos de mundo. Será
uma suite com vista para a favela, não há
mesmo terras nesta era virtual, cheia de informação
formal por onde passarão vários Pilatos fazendo
o sinal da cruz ao final da campanha.
E lhes garanto que não será por falta de benção
que a ORDEM não chegará ao Congresso pois
este é o PROGRESSO abençoado por todos os
seus santos, padrinhos, coronéis com os quais religiosamente
ajudam a lavar as escadarias da memória brasileira.
A farsa da continuidade, agenciando um privilegio aqui outro
acolá, a farsa do jeitinho brasileiro e do salário
mínimo na mesma bunda. Haja bunda Brasil!
Fica antenado pessoal, se liga que há um boi na linha
do povo. Alias, falando nisso repararam as antenas novas
da USP? Sublocação virtual. Por isso eu gosto
desse berço da tecnologia brasileira é que
sempre trazem as novidades da moda.
Aguardem novas noticias a qualquer momento aqui na coluna
do Edi (é sem acento.....).
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Usp
- 2000
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Boi
de Cara Preta da Silva,
desempregado em Filosofia pela PUC/SP
Caros
colegas, esta é a universidade do futuro. É
o produto final do Sistema Educacional Internacional e talvez
por estarmos tão próximos do seu processo
digestivo não tenhamos nos mantido em movimento frente
ao isolamento da FFLCH, à reforma educacional, ao
policiamento, às câmeras, ao fim da venda de
cervejas, à perda de autonomia e independência
dos CAs, à taxação indireta dos estudantes
e à esterilização social.
Ficamos parados frente ao movimento convulso da sua digestão.
Em nome de alinhamentos com o pretenso progresso da modernidade
e com as suas exigências econômicas de amplo
espectro neo-liberal, tudo acaba sendo legislado dentro
da maior soberania popular, que evidentemente é marcado
pelo abuso de poder e os monopólios fechados.
Nesse nosso moderno sistema democrático, existe um
percebido aparelho repressivo que vigia, pune, corrompe
e mata (até crianças); e que aliado ao judiciário
nos ajuda a separar o que é público do que
é privado. A balança do leilão.
Se assim é, então qual é a nossa participação
real nesta divisão eqüitativa do poder?
Vemos pelo contrario que a comunidade uspiana se restringe
a docentes, alunos e funcionários; ignorando a sua
própria história na vizinhança.
Enquanto isso no interior do monstro, há instalações
estudantis que não reúnem condições
de segurança mínimas.
Mas nem tudo são lágrimas, dentro da USP também
há luxuosas instalações destinadas
ao uso e à manipulação militar que
mexe com material radioativo e atômico. Se perguntaram
já porque a marinha pode gerir um espaço público
e o CA não?
E o melhor de tudo é que ainda resta à educação
o recurso último de formação de mão-de-obra
qualificada, adequar-se a este "sistema". Educação
básica. Preço básico.
A universidade não é um grande estacionamento,
nem espaço aberto a licitações ilícitas,
e sim um espaço comum a toda cultura espalhando seu
centro em toda parte.
E enquanto se desrespeitam direitos básicos de cidadania,
caros colegas, nós, os formadores de consciência,
estamos ocupando espaço e caminhando conforme os
desígnios da Ordem Vigente.
Não fique parado refletindo sobre a grandiosidade
desta universidade que os acolheu e na complexidade da sua
estrutura alimentícia. Mantenha-se em movimento,
ou nesse intestino você também pode virar cocô.
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Retroceder
é preciso
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Alegria
do Povo da Silva
O brasileiro nasce com um sonho: ser craque de futebol,
ficar rico, poderoso e conhecido, bastando para isso ser
dedicado. Conhecido poderá "descolar" uma
"boa loira" para com ela construir um "Patri-Matrimônio".
Nem esse sonho o brasileiro vai mais poder ter. Acabaram
com o futebol - faz tempo, é verdade - fazendo "evoluir"
a revolucionária co-gestão entre a Parmalat
e a SE Palmeiras.
Menos pior que, no país dos desempregados, os jogadores,
num futuro já bem próximo, poderão
transformar-se em camelôs de produtos, por exemplo
da "nova" marca de sabonetes e outras quinquilharias
chamada Corinthians, idéia esta "genial"
do fanático torcedor alvi-negro Washington Olivetto.
Não se pode desprezar a possibilidade de o Corinthians
vir a pagar direitos trabalhistas de algum jogador, no futuro,
com toneladas de sabonetes, após devidamente penhoradas
por algum advogado. O que já garantiria uma boa quantidade
de "novas" barracas de camelôs, gerando
"empregos".
A W/Brasil de Olivetto foi contratada pela Corinthians
Licenciamentos Ltda., que detém 85% das ações
e controla o futebol do clube, preocupada que está
com a imagem do Corinthians, certamente uma "evolução"
se comparada à arcaica co-gestão citada.
Daqui a pouco vão acabar vendendo o que resta do
Corinthians em nome da "modernidade" e,
quando se derem conta, Corinthians vai ser sinônimo
de aparelho de barbear.
Pior para os torcedores dos outros clubes tradicionais que
serão obrigados a consumir Hambúrguer Corinthians,
ou Fio Dental Corinthians ou ainda Absorvente Íntimo
Corinthians.
Agora que sabemos que o mundo não acabou ontem, imaginem-se
num acampamento na mística São Tomé
das Letras (MG):
"- Marina, por favor pegue lá o Corinthians
que eu quero fazer a barba"; ou então:
"- Marina, traga-me o Corinthians que o meu
já está na hora de trocar (absorvente íntimo).
Obrigada!"
Quando por acaso as Panelas Corinthians já
tiverem alcançado notoriedade, outras marcas tenderão
a "evoluir" para a extinção, gerando
mais monopólios e o que é melhor, no Brasil
dos 500 anos: mais desempregos!
Retroceder é preciso! Onde estará o futebol?
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Mas
eu devo o quê?...
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Pérola
Negra da Silva
"Consta
nos registros de nossa empresa o não pagamento
da prestação do presente mês. Pedimos
a regularização dessa dívida..."
Mas eu devo o quê? Trabalho voluntariamente com educação
de jovens e adultos e no entanto continuo devendo. Devo
para quem? Para empresas privadas que conseguiram me empacotar
em um pequeno apartamento. Devo para empresas privadas que
me ofereceram uma gama de aparelhos de comunicação
como telefone, celular, pager e no entanto comunicar-me
com as pessoas é de uma dificuldade grande. Devo
para empresas de TV paga, para os serviços condominiais,
para o convênio - saúde. Tudo é privado,
tudo se transforma em privado. Apenas as pessoas que não
têm carteirinha empresarial são privadas de
sua sobrevivência. E o que importa? O privado ou as
pessoas? Resolver a burocracia ou resolver as privações
das pessoas? Tempos difíceis e ninguém vai
para o inferno, pois está nele.
Estamos sem casa, sem assistência médica, sem
comunicação, sem escola, sem carteirinha.
Pedimos a regularização dessa dívida.
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OUTRAS
LETRAS
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Kimbanda
da Silva
desempregada em Literatura pela PUC/SP
No
mais profundo desconhecido também cria-se literatura.
E, inclusive, em língua portuguesa. Falo dos 5 países
africanos de língua oficial portuguesa - Angola,
Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique e São
Tomé e Príncipe -, nos quais há literaturas
belíssimas, portadoras de contribuições
fundamentais, para as quais urgem acesso e atenção
maiores. Olhar para elas, aproximar-se delas. Entre as diversas
razões possíveis de se apontar para tal, elas
trazem a nosso alcance realidades outras, através
de uma língua portuguesa transformada, apropriada
também por estes países. Língua que
não é só de Portugal e Brasil, portanto.
As literaturas africanas de língua portuguesa foram
intensificadas junto aos processos de construção
das identidades e independências nacionais - anos
1940 - e hoje estão em presença da complexidade
do pós-independência. A extrema euforia passou;
a reflexão é intensa. A(s) utopia(s) recebe(m)
duros golpes, fragiliza(m)-se. Diante dos novos problemas
e questões, muitos ainda não pensados, há
que criar novas possibilidades, paulatinamente. Utopias
transformadas. Sem esquecer as especificidades africanas
(e latino-americanas...). Para tanto, a literatura é
essencial, um campo aberto às idéias e aos
sonhos. Outros sonhos. Novos. Afinal, não disseram
tudo. Ainda há espaço para a criação.
Não previram tudo e nós queremos criar.
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Os
assassinos de Márcio e Brigite
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Vez
por Outra da Silva
Márcio
e Brigite foram assassinados!, era a mensagem enviada
pelo pager para aquela que, por tê-los primeiramente
introduzidos no CRUSP, era considerada sua cuidadora, aquela
que os levava para a vida... Na operadora, o rapaz que transmitia
o recado recusava-se a passá-lo duas vezes, devido
à drasticidade da mensagem, enquanto no outro
lado da cidade um beep soava e a indignação
começava a permear entre aqueles que os conheceram
mais de perto.
Sim, porque desde aquela noite do dia 28 de agosto de 1999,
eles eram parte da vida aqui. Participaram de festas, eventos
culturais, ou mesmo das típicas baladas de última
hora, para as quais tinham sempre lugar garantido atrás
de um véu sob luz, sobre um móvel, no chão,
ou mesmo em cima das árvores. Fora do agito, enfeitavam
apartamentos, serviam de manequin para roupas, chapéus
e toda sorte de penduricalhos que ora lhes punham, ora lhes
tiravam, para não os aborrecerem com a mesmice da
rotina.
Certamente eram sempre os primeiros a ser notados em qualquer
ambiente que estivessem. Havia sempre alguém a ajeitar-lhes
um adereço, mudar-lhes a posição, separá-los
ou juntá-los num sexo forçado e explícito,
ou mesmo bolinar os peitos de Brigite, que também
alternavam em cobertos e desnudos, tudo para satisfazaer
o nosso bel prazer.
Mas não foi sempre assim. Antes de sua chegada ao
nosso reduto, Márcio e Brigite já tinham muitas
estórias vividas juntos. Márcio fora encontrado
no lixo e trazido para casa pelas mãos da irmã
de nossa amiga em questão, que a presenteou. E Brigite
veio logo em seguida, também, doada por um amigo
de sua mais alta estima.
Daí ganharam o mundo... Já nessa época,
foram levados para a PUC, onde permaneceram no CAFIL por
longa data, participando da política estudantil,
aconselhando votantes, ponderando decisões, servindo
de ombros amigos aos que entravam e saíam do local.
Muitas foram as atividas das quais participaram: foram à
SBPC de 96 conta-se desse episódio que foram
barrados na abertura, pois havia pessoas muito importantes
do governo, mas, já no dia seguinte, participaram
de todas as atividades do evento, inclusive do Projeto Equilíbrio,
e agradaram a todos os mortais não governamentais
-; tomaram parte em todas as festividades e comemorações
dos cinqüenta anos da PUC; juntaram-se aos aventos
culturais no Minhocão, onde foram fotografados por
niguém mais, niguém menos que Sebastião
Salgado; e lá estavam eles também na campanha
contra a AIDS, por ocasião da Feira da Pompéia
de 97. Foi nessa época, ainda, que se deu o hilário
acidente. Luíza Erundia, ex-prefeita de São
Paulo, fora visitar a universidade católica, e encontrou-se
com nossos amigos, até posando para foto com Márico
e José Eduardo Cardoso. Foi quando passa pela curva
do rio (aquela rua sinuosa que separa os dois lados
da universidade), que alguns alunos revoltosos com sua visita
iniciaram uma confusão e lá se foram os braços
e pernas de Brigite, mais à mão para ajudar
na pancadaria, deixando-a como a conhecemos quando aqui
chegou.
Mas tal fato nunca a impedia de desfilar, ao estilo Vênus,
todos os modelitos com os quais já fora presenteada
e, diga-se de passagem, suas roupas até mesmo
foram emprestadas por algumas de nossas amigas daqui, tão
de bom gosto lhes pareceram. E se tivessem que ficar nus,
faziam-no confortavelmente, exibindo somente os novos tons
com os quais vez por outra os amigos lhes enfeitavam. Sim,
porque sempre foram alvos de pinceladas das mais diversas
cores (e até de todas juntas!).
Por isso nossa indignação foi tamanha! Pois
nosso amigo mal podia acrditar ao descer as escadarias de
seu bloco e deparar-se com somente as cinzas do que foram
Márico e Brigite, ali,coincidentemente no mesmo lugar
onde primeiramente chegaram. E o que sabiam jamais poderia
ser argumento para uma queima de arquivo. Sabiam
apenas nos encantar. E quem assim procedeu, certamente tinha
a dimensão de que eram parte de todos nós,
e sucetíveis aos nossos caprichos. Eu que os conheci
bem, tomo como minha parte, prestar-lhes esta homenagem,
e lembrar seu eterno amor, não sem um tanto de tristeza,
por dias de mais respeito e paz.
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DEBATE
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clique aqui
O
texto abaixo, publicado no número 2 do zine Epidêmico
da Silva, provocou a reação da leitora Claudia
Teófilo, que escreveu uma missiva para o autor. Depois
do ler o texto, clique no link para acompanhar a contenda.
Crusp
Credo Cristão
Apreciador
de Varais da Silva,
Já
se fez memória e razão de exposições
os reverenciados, dourados e quase mitológicos anos
de resistência à ditadura e retomada da moradia
estudantil. A cara da moradia, seus moradores e idéias
predominantes, sempre refletiu sua configuração
político-institucional. Hoje, sete anos depois da
invasão do penúltimo bloco, o bloco D (o último
será onde é a atual reitoria), continuamos
com cães e gatos, o número de crianças
cruspianas cresce geometricamente, a autogestão não
vingou, a conjuntura internacional deteriora-se e leva consigo
os últimos suspiros do sonho de uma nação...
Não bastasse, agora temos missa no CRUSP, lá
na sala de reuniões da COSEAS. Significativa constatação
da aliança Estado-Igreja. Aliás, como será
que se definirão os cristãos daqui? vão
aí algumas sugestões: Comunidade Cristã
Cruspiana, Cu do Cristo Cruspiano, Crusp Cristão
do Caralho, vai gostar de CCCs assim lá na casa do
Capeta! Cristóides, tristóides, sejam ao menos
hare-khrisnas, ocupem o espaço público no
meio dos moradores, tragam música e alegria, alimentem
a carne para que esta possa pensar no espírito. Como
já dizia o velho Raul: ...chega de reza, terço
e oração... eu quero ver vocês em ação....
Clique
aqui para ler a missiva enviada ao autor do texto e a resposta
do Apreciador de Varais da Silva
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Entrevista
com Pepetela
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Por
Rouge da Silva
O
escritor angolano Pepetela, ganhador do Prêmio Camões
de 1997, foi guerrilheiro durante a luta pela libertação
de Angola e, após, Vice-Ministro da Educação.
Hoje, além de escritor - romancista, principalmente
-, é professor de sociologia em Luanda. Em 5 de maio
a repórter Rouge da Silva entrevistou-o.
da
Silva: Primeiramente eu gostaria que você apresentasse
um pouco para as pessoas como está a situação
atual da guerra em Angola.
Pepetela: Essa guerra já dura mais ou menos
há 40 anos. Mas a última fase da guerra tem
sido uma guerra civil. É uma guerra civil, fundamentalmente
entre dois partidos políticos, e muito violenta,
sobretudo depois que houve as eleições em
1992, em que um dos partidos ganhou as eleições:
o MPLA, que já estava no governo, continuou portanto
no poder. E o partido de oposição armado [a
Unita] não aceitou o resultado das eleições
e recomeçou a guerra. Agora, a fase atual da situação
é que há um abrandamento, um abrandamento
grande da guerra. Porque houve de facto uma vitória
militar, digamos do governo, ou do exército governamental,
sobre esse partido de oposição, em termos
de guerra clássica, convencional, com canhões,
com material pesado e tal. Houve uma derrota grande desse
partido. E esse partido passou agora para uma guerra de
guerrilhas, portanto pequenos grupos, com armas muito ligeiras
e atacando posições geralmente quando sabem
que não está lá a polícia, não
está o exército. Uma guerra de guerrilha sobretudo
com alvos civis. E o líder [Jonas Savimbi], segundo
informações que há, que se diz, é
que está cercado e poderá ser apanhado, a
qualquer momento. Portanto, talvez, talvez haja uma situação,
é uma situação nova, de levar a um
grande desequilíbrio militar e pode ser que isso
leve a um acordo definitivo de paz, de paz definitiva. E
há uma série de iniciativas nesse sentido,
de fazer com que se volte a discutir o assunto e se chegue
à paz. Agora, o grande problema é que o...,
há um problema político no fundo e muito particularmente
um problema até de repartição da riqueza,
quer dizer, há uma concentração grande
da riqueza na capital, o resto do país está
quase que abandonado, né? E portanto, pode mesmo
chegar a ser uma situação de paz, digamos
de não guerra, né?, mas isso não resolver,
quer dizer, continuar a haver uma grande tensão social,
com muito desemprego, muita miséria, e ao mesmo tempo
muito ricos, ou melhor, pessoas muito ricas, não
é? Poucas pessoas muito ricas a conviver, e portanto,
bom, partiremos para um outro tipo de guerra, no fundo.
Essa é a preocupação, penso eu, a preocupação
agora realmente é chegar a uma paz que seja de facto
uma paz, que dê para que a sociedade se refaça,
de forma mais justa.
da Silva: Gostaria que comentasse a reação
da grande maioria da população à guerra,
se há manifestações etc.
Pepetela: A população é claro
que... a população é contra a guerra
e quer a paz, né? Toda população precisa
de paz, e quando há tantos anos de guerra está
toda a gente cansada, sem dúvida alguma, né?
Agora, muitas vezes não tem a capacidade de manifestar
esse desejo, não é? Mas, vão aparecendo
setores, certos setores que vão manifestando isso,
ou na imprensa, ou em debates, ou manifestações.
Por vezes há, umas pessoas juntam-se e passam pelas
ruas pedindo a paz etc. Ou no seio das igrejas, sobretudo
aproveitando um pouco a proteção que as igrejas
dão, para pedir e para debater essa questão
da paz. Realmente há uma série de iniciativas
nesse sentido, e eu penso que a sociedade está cada
vez mais, vai fazendo cada vez mais pressão nesse
sentido, junto..., junto duma das partes, porque a pressão
realmente é feita junto do governo, não é?
Mas, era preciso também que se pudesse fazer pressão
sobre o outro lado, né?, mas aí tem sido a
pressão militar, só.
da
Silva: Qual é o posicionamento dos intelectuais
frente a essas questões?
Pepetela: Bom, eu penso que os intelectuais também
querem a paz e..., mas tem havido alguns que tomam posição
pública, outros estão mais calados, não
é? Mas, de um modo geral, eu penso que o intelectual
tem que seguir o que o povo acha. O povo quer a paz e acabou,
não há mais discussão.
da Silva: E quais são as razões da guerra
hoje?
Pepetela: Não, hoje a guerra é apenas
uma luta pelo poder, mais nada, né? Quer dizer, bom,
um partido perdeu as eleições, devia ter aceitado
esse jogo democrático, ficava na oposição
durante 4 anos, havia novas eleições e ia
ganhar, o mais certo é que ganharia assim. E, bom,
não quis!... E também nunca mais houve eleições,
porque houve mais guerra, nunca mais houve eleições
(riso). Mas é só uma luta pelo poder. Já
não há diferenças ideológicas,
étnicas ou o que seja. Não há, é
só luta pelo poder e acabou.
da Silva: Para finalizar, o que seria realmente a paz
em Angola? Que tipo de idéias, projetos, propostas
ela envolveria para estar se realizando efetivamente?
Pepetela: É, muito resumidamente eu diria
que era preciso haver uma repartição mais
correta da riqueza nacional, que é grande. Angola
é um país com muitas possibilidades, mas a
riqueza está muito mal repartida e, aliás,
quem explora, quem aproveita essa riqueza são os
estrangeiros, nem são os angolanos. Ah..., teria
de haver portanto uma maior, digamos, igualdade nas próprias
regiões do país, ah..., uma ligação
maior entre as cidades e o campo. Ah..., e uma valorização,
uma valorização da maneira de pensar e os
desejos das populações que têm sido
as mais marginalizadas por todos esses processos, quer dizer,
que são as populações camponesas, e
que têm sofrido mais com a guerra, não é?
Porque nem podem cultivar, muitas vezes, porque os terrenos
estão cheios de minas, não é?, etc.
É, e que têm muita coisa para dizer, e a maior
parte das vezes nunca têm voz para isso. E um pouco
eu acho que os próprios escritores têm que
assumir de uma vez por todas isso, que eles sejam a voz
dessas populações que não têm
voz.
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