Nascido na Beira (Moçambique), em 1955, Mia Couto é considerado uma dos nomes mais importantes da nova geração de escritores africanos que escrevem em português. Este estatuto incontestado deve-se não só à forma como descreve e trata os problemas e a vida quotidiana do Moçambique contemporâneo, mas principalmente à inventiva poética da sua escrita, numa permanente descoberta de novas palavras através de um processo de mestiçagem entre o português “culto” e as várias formas e variantes dialetais introduzidas pelas populações moçambicanas. Mia é assim uma espécie de mágico da língua, criando,apropriando, recriando, renovando a língua portuguesa em novas e inesperadas direcções. Tem, devido a essa autêntica revolução de inventiva linguística, sido muito apropriadamente comparado a um outro grande mágico da Língua Portuguesa do século XX, o escritor brasileiro João Guimarães Rosa.
António Emílio Leite Couto, mais conhecido por Mia Couto (uma alcunha que ele conserva desde infância), foi, desde 1974 e durante vários anos, diretor da Agência de Informação de Moçambique, seguidamente dirigiu o jornal Notícias de Maputo e a revista Tempo. Posteriormente, estudou Medicina e Biologia e é atualmente biólogo na reserva natural da Ilha da Inhaca, em Moçambique.
A escrita tem sido no entanto uma paixão constante, desde a poesia, com que se estreou em 1983 (A Raiz de Orvalho), até à escrita jornalística (bem presente no livro que reúne as crónicas escritas para o jornal “Notícias de Maputo”, Cronicando) e à prosa de ficção. A questão do género literário não é, de resto, a mais importante para um autor em cuja escrita prosa e poesia se contaminam e que escreve “pelo prazer de desarrumar a língua”. Questões mais importantes reflectidas na sua obra são as relacionadas com a vida do povo moçambicano, um dos mais pobres e martirizados do mundo, recém-saído de 30 anos de guerra civil e onde persiste uma forte tradição de transmissão da literatura e dos saberes essencialmente por via oral. Numa cultura onde se diz que “cada velho que morre é uma biblioteca que arde”, Mia empreende uma escrita que liga a tradição oral africana à tradição literária ocidental, tal como no seu trabalho de biólogo liga, no estudo da floresta, o saber ancestral dos anciãos sobre o espírito das árvores e das plantas à moderna ciência da Ecologia. Essencial, num caso como noutro,é sempre a relação mais profunda entre o humano e a terra, entre um humano e outro humano, por vezes nas suas condições mais extremas, como no seu primeiro romance, Terra Sonâmbula, saudado pela crítica como um dos melhores romances em português dos últimos anos e que descreve a luta pela sobrevivência durante a guerra civil em Moçambique.
Obra:
Poesia
A Raiz de Orvalho. Maputo: Cadernos Tempo, 1983.
Crónica
Cronicando. Maputo: Notícias, 1986. Lisboa: Caminho, 1991. Maputo: Ndjira, 1999.
Ficção
Vozes Anoitecidas.(contos) Maputo: Assoc. dos Escritores Moçambicanos, 1986. Lisboa: Caminho, 1987, 3ª ed. 1995. Cada Homem É uma Raça.(contos). Lisboa: Caminho, 1990, 3ª ed., 1994. Terra Sonâmbula. (romance) : Lisbos: Caminho, 1992; 2ª ed. 1996, Lisboa. São paulo: Nova Fronteira,1995. Estórias Abensonhadas. (contos) Lisboa: Caminho, 1994. A Varanda do Frangipani. (romance) Lisboa: Caminho, 1996. Contos do Nascer da Terra. (contos) Lisboa: Caminho, 1997. Mar me quer. Lisboa: Colecção 98Mares, Expo’98 , 1997.
Prémios:
Grande Prémio da Ficção Narrativa de Moçambique (ex-aequo), 1990 (Vozes Anoitecidas) Prémio Anual de Jornalismo Areosa Pena, 1989 (Cronicando) Prémio Nacional de Ficção da Associação de Escritores Moçambicanos, 1995 (Terra Sonâmbula) Prémio da Associação dos Críticos de Arte de S. Paulo (Brasil) 1996.