Por Mano Brown
(…) Sem pretensão, a gente aqui do Capão nunca ia conseguir chamar a atenção do resto do mundo, porque da ponte João Dias pra cá é outro mundo, tá ligado? Eu nem sei o significado do nome Capão e nem por que seria Redondo.
Eu era bem pivetinho e já ligava o nome Capão Redondo a sofrimento, 80% dos primeiros moradores, ou quase primeiros, eram nordestinos, analfabetos. Gente muito humilde, sofredora, que gosta da coisa certa. Gente igual à minha mãe.
(…) São Paulo Massacra os + pobres e aqui no extremo sul eu senti na pele o que é ser preto, pobre, filho de mãe solteira negra, que veio da Bahia com doze anos de idade. Aprendi a não gostar de polícia, sei o que é andar muito loko três, quatro dias direto e nem por isso atravessar o caminho de ninguém.
No Capão Redondo é onde a foto não tem inspiração pra cartão-postal. Os turistas não vêm gastar os dólares e os poetas nunca nem sequer ouviram falar, pra citar nos sambas-enredo. Capão Redondo é a pobreza, injustiça, ruas de terra, esgoto a céu aberto, crianças descalças, distritos lotados, veículo do IML subindo e descendo pra láe pra cá, tensão e cheiro de maconha o tempo todo.
(…) São Paulo não é a cidade maravilhosa, e o Capão Redondo no lado sul do mapa, muito menos. Aqui as história de crime não têm romantismo e nem heróis.
Mas, aí! Eu amo essa porra!
de Capão Pecado
Labortexto editorial, 2000