Extraído
de Sonhos de Bunker Hill
Editora Brasiliense
O Duque
contra Richard-Coração-de-Leão.
A luta começou
com os dois lutadores encarando-se no meio do ringue. O Duque
tinha mais ou menos 1,60 de altura e pesava 170 quilos. Richard
Coração-de-Leão tinha 1,90 e pesava 170 quilos. Eles se moveram,
preparando-se para o encontro. Rapidamente o Duque escorregou
por entre as pernas do Coração-de-Leão e agarrou o penteado esvoaçante
do grande homem. Ele caiu como uma tonelada de carvão. O Duque
pulou em cima e tentou uma tesoura em volta de seu pescoço. Coração-de-Leão
debateu-se inutilmente, seu rosto começando a ficar azul. A multidão
levantou-se, tremendo de ódio. Uma mulher subiu pelas cordas e
esmurrou o Duque varias vezes com a bolsa. A multidão gritou.
Duas outras moderes pularam para o ringue, tiraram os sapatos
e deram um soco terrível no rude italiano, forçando-o a afrouxar
a tesoura sobre o pescoço do Coração-de-Leão.
O juiz apitou e ajudou o Duque no seu canto. Chamaram novamente.
Desta vez Coração-de-Leão estava em vantagem, ergueu o Duque sobre
sua cabeça e girou e girou ate atira-lo violentamente na lona.
A multidão gritava de alegria. O Duque ficou deitado imóvel, parecendo
inconsciente. Coração-de-Leão pegou-o, carregou-o ate a borda
do ringue e jogou-o sobre as cordas ate o colo de três mulheres.
Ele parecia insensível, imóvel. As mulheres o atiraram no chão
e bateram nele. Para escapar delas, ele rolou, cambaleou sobre
os pés e subiu dolorosamente de volta ao ringue, o rosto coberto
de sangue.
O Juiz apitou e ajudou o Duque ate seu canto. Chamaram um medico.
Ele limpou o sangue, anunciou que o Duque estava em bom estado
e ordenou que a luta continuasse. O Duque arrastou-se sobre os
pés, mas estava tão grogue que rodopiou pelo ringue num entorpecimento.
Do outro lado do ringue, Coração-de-Leão mirou bem o alvo e acertou
o Duque direto no estomago. O Duque caiu de novo. Coração-de-Leão
atirou-se sobre o corpo caído, agarrou os pés do Duque e dobrou-os
para trás quase quebrando seus tornozelos. A multidão, fascinada,
parecia murmurar de prazer. O juiz inclinou-se para ver se os
ombros do Duque tinham tocado a lona. O triunfante Coração-de-Leão,
ainda segurando os pés do Duque quase a altura das costas, acenou
para a multidão e a multidão acenou-lhe de volta. Eu estava mais
preocupado com a morte do Duque do que com sua derrota: ele continuava
imóvel, os olhos fechados, ofegando pesadamente.
Subitamente ele se mexeu, e seus pequenos braços grossos jogaram-se
em direção das mechas do cabelo de Coração-de-Leão. A multidão
olhava horrorizada. Um grito de agonia encheu o auditório, quando
as mãos do Duque saíram cheias de fios de cabelo dourado e empurraram
o Coração-de-Leão para o lado. Grotescamente, como um caranguejo
se arrumando, o Duque agarrou o próprio cabelo enquanto levantava.
As mulheres tremiam. Algumas choraram enquanto ele arrastava o
Coração-de-Leão pelos cabelos em volta do ringue.
O Duque variava seu ataque. Agora ele chutava o Coração-de-Leão
no maxilar. Depois sentou-se sobre o rosto dele e arriou seu corpo
sem piedade, rindo para a platéia, escarnecendo dos protestos.
Então sentou-se sobre as costas do Coração-de-Leão, seus ombros
perigosamente próximos da lona. De repente o belo homem sucumbiu,
seu ombro tocaram a lona. O Duque sentou-se sobre ele e beliscou
seu nariz. Era um insulto insuportável. O juiz declarou a Duque
vencedor do primeiro round.
Jenny Palladino
- a Garota do Duque
Eu
estava sentado na varanda lendo Melville quando o carro surgiu.
Era um Ford modelo-A, e o motorista era uma garota. Ela parou
a maquina e desceu. Olhei para a praia. 0 Duque não estava a vista.
A garota atravessou até a varanda dele e bateu na porta. Era maravilhosa,
vestida numa mini-saia azul e num suéter azul. Seu rabo era do
paraíso. Seu rosto era exoticamente fino sob a franja dos cabelos
pretos e olhos brilhantes.
- Ele não está - eu disse. - Está treinando na praia.
Ela olhou para cima e para baixo do areal.
- Para que lado ele foi?
Apontei.
- Ele está puxando um grande carreto vermelho.
- Obrigada. Ele vai demorar?
- Talvez uma hora. O Duque e eu somos amigos. Por que não se senta
e espera?
Ela olhou em volta procurando uma cadeira.
- Desculpe - eu disse. - Gostaria de entrar?
- Não, obrigada.
Recostou-se no posto e mergulhou em silêncio. Eu me levantei.
- Posso lhe oferecer alguma coisa? Que tal um café? Acabei de
fazer.
- Não, obrigada.
- Sou Arturo Bandini.
- Muito Prazer. Sou Jenny Palladino.
- De Lompoc - eu disse sorrindo.
Surpresa, ela perguntou:
- Como soube?
- 0 Duque contou. - Abri a porta de tela. - Por favor, entre.
Eu faço um ótimo café.
- Não, obrigada.
- Não tenha medo. Se é amiga do Duque, esta totalmente salva aqui.
Eu tenho cara de quem passaria uma cantada na garota do Duque
de Sardenha?
Ela me estudou seriamente, depois sorriu.
- Acho que não. - Entre - me apressei. - Seja minha convidada.
- Bem...- ela hesitou.
- Por favor, não se preocupe. Morro de medo do Duque.
Ela entrou. Levei-a ate a melhor cadeira e ela sentou. De repente
uma sensação de leviandade tomou conta de mim. Havia algo de reprovador
nos olhos dela e na saliência de seu lábio inferior. Eu não pensava
em passar uma cantada nela. Queria apenas brincar, entrar numa
espécie de jogo com ela. Servi uma xícara de café, ela me agradeceu
e bebeu. Era bonita, sensual e maravilhosamente bem feita. Ainda
assim eu não a desejava, sentia apenas uma vontade de rolar com
ela como se fossemos dois gatinhos.
Ajoelhei-me diante dela e ela rapidamente pôs os pés em cima da
cadeira.
- Oh, mais querida das filhas de Eva - eu disse com entonação
musical -, doces são teus olhos e gloriosos são os seus arcos.
Abençoadas sejas, virgem adorável, na curvatura teu pescoço escultural.
Não me expulses, pois que há muito eu espero gozar no brilho de
teus olhos maravilhosos.
Ela comprimiu os lábios com desaprovação.
- Então é você! - disse. - Eu sabia que não era o Duque. Não podia
ser.
- Escuta oh amor! o vôo da perdiz, batendo asas sobre o celeiro,
procurando seu amado no feno ceifado e fresco. Trazei-a até mim,
oh pássaros viajantes, que ela não sofra mergulhada em medo.
Ela
pulou da cadeira e me empurrou para o lado.
- Deixe-me em paz - disse. Depois começou a gritar:
- Duque! Duque!
Parou
para tirar os sapatos e fugiu como uma corça amedrontada. Ao longe,
começando a aparecer, avistei a figura desajeitada do Duque dirigindo
seu carreto vermelho. Fiquei parado lá, por um momento, aterrorizado.
Depois fiz o que tinha de ser feito.
Joguei minhas roupas nas malas, peguei a máquina de escrever e
corri para o carro, enfiando tudo no banco traseiro. Corri outra
vez de volta à casa, para mais um carregamento.Quando voltava
vi Jenny Paladino diante do Duque, gesticulando com as duas mãos.
Ele se soltou e disparou correndo em minha direção. Juntei os
livros e uma capa, corri para o carro e liguei o motor. O duque
estava a cem metros quando disparei pelo quintal até a estrada.
Pelo espelho retrovisor pude vê-lo mostrando o pulso e amaldiçoando.
Entrei na rodovia e dirigi pela ponte de volta a Los Angeles...

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