Por
Mário Satto
Hollywood
é a novela
em que Bukowski narra sua experiência nos bastidores do cinema.
Convidado a escrever um argumento para o cinema, Bukowski -aos
58 anos, um autor já consagrado entre os leitores de vários países-é
levado a deixar de lado a aversão que sempre manifestou em relação
à Sétima Arte. Tudo pelos vinte mil dólares que lhe seriam pagos
pelo trabalho.
A
dúvida, para o seu fiel público leitor, é: conseguirá a autenticidade
da sua escrita sobreviver ao apelo do sucesso efêmero nas telas
-do qual afinal ele não precisa? O santo beberrão estaria deixando
o submundo dos bares e das ruas pela alta roda dos artistas de
cinema? Sua alma estaria sendo sugada pelos holofotes de Hollywood?
É talvez para responder a si mesmo a aos seus leitores que Bukowski
escreveu Hollywood. E ele prova que o seu estilo continua
o mesmo: forte, conciso, impactante, dotado do mais fino humor
e da ternura selvagem que conhecemos desde Cartas na rua e Notas
de um velho safado. Os diálogos estão como sempre: impagáveis.
A descrição de um documentário sobre um ditador africano, dirigido
pelo mesmo diretor que filmou o argumento escrito por Bukowski,
é um dos pontos altos do livro. Três páginas antológicas que mostram
como o cinema fica desbotado se comparado a uma escrita como a
de Bukowski. Há também breves comentários reflexivos sobre a vida
e a carreira do autor que mostram o quanto ele estava preocupado
em manter a sua identidade de escritor.
"Escrever
nunca foi trabalho para min. Sempre fora assim, desde quando
me lembrava: ligar o rádio numa estação de música clássica,
acender um cigarro ou charuto, abrir a garrafa. A máquina fazia
o resto. Eu só precisava estar ali. Todo o processo me permitia
seguir em frente quando a vida oferecia tão pouco, quando a
própria vida era um espetáculo de horror. Sempre havia a máquina
para me acalmar, conversar comigo, me entreter, salvar meu rabo.
Basicamente, era por isso que eu escrevia: para salvar meu rabo
do asilo dos doidos, das ruas, de min mesmo."
Ou:
"Escrever
era estranho. Eu precisava escrever, era como uma doença, uma
droga, uma forte compulsão, mas não me agradava pensar em min
mesmo como escritor. Talvez tivesse conhecido escritores demais."

Bukowski
e Mickey Pourke durante as filmagens de Barfly.
Hollywood
vive tentando transformar literatura em cinema. E fracassa quase
sempre quando se trata de boa literatura. Bukowski é o primeiro
a transformar cinema em literatura de alta qualidade.
Que os cinéfilos julguem o filme que resultou do argumento escrito
por Bukowski (Barfly, dirigido por Barbet Schroeder, com
Faye Dunaway e Mickey Rourke).
Que os leitores se deliciem com a obra prima que é Hollywood
(o livro).
Hollywood,
de Charles Bukowski
Tradução de Marcos Santarrita
L&PM editores,
1989

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